Simplesmente lindo, como a mais bela amizade

Simplesmente lindo, como a mais bela amizade

quarta-feira, 13 de julho de 2011

Conto



As árvores ladeavam o pequeno caminho a frente. O caminho que lembrava uma fila indiana, era feito de arbustos e capim seco, e serpenteava cerrado adentro.
Um pequeno ben-te-vi cantava em um galho baixo de Jatobá, o peito amarelado reluzia sob o sol da manhã, e seu canto triste, deixava o sertão a sua frente, ainda mais solitário. Carregava em sua bicicleta a enxada, facão e a foice amarrados na garupa. O caminho a muito conhecido não lhe interessava ao todo, sua curiosidade aguçada se mantinha aos arredores, observando movimentos suspeitos, que poderiam significar uma serpente: muito comum ali.
A pequena troucha que trazia amarrada precariamente ao guidão fazia um tilintar abafado, a cada vez que passava por uma falha no caminho. Era época de chuvas e a estrada exibia as lembranças das fortes chuvas, que haviam ocorrido recentemente.
A bicicleta sacodia o corpo marcado pelo sol. A pele bronzeada adquirira uma tonalidade que lembrava o dourado, ali não haviam meios de fugir do calor e força do sol, que começa a raiar naquele momento.
A conhecida curva desembocava em um pequeno riacho, ladeado por pedras e árvores baixas, e que era formado por águas cristalinas. Ele existia apenas nesta época do ano, a mina da qual brotara transbordava e dava origem aquele coricho efémero, que dava vida por uns meses aquele pedaço de terra que tanto sofria pelas secas.
Ele para a uns metros adiante. O local está descampado, colocara fogo naquele pedaço a não muitos dias. O pequeno pedaço que exibia apenas tocos negros como carvão não media mais que uma hectare, mas aquilo devia ser suficiente para o que queria fazer.
Colocou a bicicleta na costumeira sombra de piuna, e desamarrou seus instrumentos de trabalho. Ainda tinha cerca de uma hora antes da próxima parada do seu dia. Ele começa a desenterrar os restos de vegetação, logo será hora de plantar milho e arroz. O singular barulho só é quebrado pelo canto dos pássaros que começam a deixar seus ninhos e o barulho do coricho ali perto.
O chapéu na cabeça é algo obrigatório em seu dia a dia.
Esquecera em casa ao pegar o almoço que a mulher lhe prepara. A camisa de manga longa começa a incomodar no calor que começa a fazer cedo. As mãos calejadas mal sentem mais o toque austero da enxada em sua mão. Iria precisar de mais um dia para preparar a terra para o plantio.
Menos de uma hora depois ele esconde suas ferramentas no mato e volta pelo mesmo caminho. Dez minutos após ele chega na fazenda próxima ao sítio em que reside.
Laços, correia, sela e montaria são agora sua ocupação. Ele se embrenha dessa vez no sertão a buscar o rebanho que saiu para pastar. É hora de procurar um outro lugar para levá-los.
Ele desconhece o medo nessas horas, é preciso ser cabra macho, como dizia seu pai quando menino, o trabalho árduo necessitava atenção e reflexos rápidos. O sertanejo sabe que a vida pelo cerrado era algo difícil, em meio ao calor, animais peçonhentos, onças, capões, era fácil se perder entre a rala vegetação.
A boiada está depois do ribeirão. É algo fundo, ladeado por pedras. Ele sabe que precisa tomar cuidado, para conseguir realizar a travessia. Ele pega o berrante do seu borná, amarrado junto a sela do cavalo. O animal recua em frente ao pequeno obstáculo.
Ele acaricia o animal. O movimento lento e calmo de alguém que sabe que tem que passar segurança, que confia no seu amigo de viagens. Ele recua um passo atrás. E calmamente começa-se a travessia, sempre incitando, sendo firme.
O berrante agora é ouvido em meio ao burburinho do riacho e de animais que correm assustados mata adentro, e a boiada pouco a pouco, começa então, a se reunir. O caminho de volta é lento, o trotar constante e sempre cuidando para que o rebanho não se disperse.
Ele olha uma vaca a tomar conta de seu bezerrinho, já no fim do dia no novo pasto em que o rebanho se encontra, em casa seu pequeno anjinho também cuida de outro daqueles bezerrinhos que perdera a mãe doente a uns meses atrás.
Ele tem pena do bichinho, que sem os seus cuidados, teria sido sacrificado. Ele desapeia na fazenda ao fim de tarde, quando o companheiro, lhe chama atenção. A Hilux estacionada na entrada da fazenda não lhe engana, o patrão chegou. Ele se resigna a ir ter com seu empregador.
No inicio da noite ele chega com a marmita amarrada no guidão novamente, dessa vez ela sacoleja e faz barulho ao desmontar de sua bicicleta. Sua mulher esta recolhendo a roupa que lavara no ribeirão, naquela manhã, do varal. Ela olha o rosto triste e resignado do marido. Sem palavra alguma ela volta a terminar sua tarefa enquanto ele entra na casinha de barro e se senta no toco à porta.
Ele observa a pequena criança com o bezerrinho não muito longe dali. A face serena brinca com um sorriso doce. Os olhos do sertanejo se fecham naquela hora. Ele entra em casa e volta com a garrafa e o bico na mão.
Amanhã teria tempo para cuidar de sua plantação.

Um comentário: